Cafés especiais só podem receber esse título se pontuarem acima de 80 pontos pela escala da SCAA, Specialty Coffee America Association

Café faz parte  do dia a dia do brasileiro desde que ele nasce. É o único país do mundo onde  nos referimos à primeira refeição do dia com alusão direta ao produto: café da manhã. Em inglês, é breakfast, em espanhol é desayuno, em francês é petit déjeuner e por aí vai.

E, apesar de sermos o maior produtor e exportador de café do mundo,  até bem pouco tempo atrás, a qualidade do nosso café era muito ruim. Dominado pelas grandes empresas alimentícias,  chegava até nós somente via supermercado e padaria sem grandes diferenciações. Optávamos por uma marca ou outra muito mais pela propaganda da TV do que pelo sabor do cafezinho nosso de cada dia.

Pois bem: em meados dos anos 80, um grupo de pessoas ligado à indústria do café dos EUA ( sempre eles!), preocupados com a perda crescente de consumidores, resolveu criar uma asssociação,  a Specialty Coffee Association of America.

 

A proprietária de uma importadora de cafés finos de São Francisco, na Califórnia,  Erna Knudsen, foi quem cunhou o termo Specialty Coffee. Café especial para ela envolve o conceito de algo de grande qualidade, raro e muito especifico. O termo foi usado em 1974, num artigo no Tea & Coffee Trade Journal. Erna utilizou o termo para descrever grãos com os melhores sabores, que eram produzidos em microclimas especiais. No artigo, a  profissional defendia que os café especiais são frutos de um relacionamento onde o produtor e o torrefador são grandes aliados do comprador.

O termo café especial só foi utilizado amplamente apenas alguns anos depois, na inauguração da primeira loja  da Starbucks, em Seatle, nos EUA.

A SCAA cresceu e, na década seguinte, criou diversos comitês de trabalho e, um deles, ganhou enorme importância, já que sua missão era a de criar normas para definir e classificar um café como especial. Esse comitê foi batizado de TSC – Technical Standards Committee ( Comitê de Normas Técnicas).

Por meio do TSC, a SCAA estabeleceu critérios rígidos para a definição e avaliação do café, a chamada Avaliação Objetiva.

As várias notas sensoriais de cafés especiais na roda de sabores da SCA

A Avaliação Objetiva quantifica a qualidade dos cafés por meio de uma escala decimal que vai de 1 a 100 pontos. Na planilha de Avaliação Sensorial, 10 diferentes atributos do café são verificados.

Baseando-se em conceitos científicos, todos os elementos empregados no processo de avaliação são milimetricamente definidos como o ponto de torra, a água empregada e as temperaturas recomendadas para a degustação.

Dessa forma, todos os  principais países produtores de cafés no mundo como Brasil, Vietnã, Etiópia, Panamá, Honduras, Colômbia, Guatemala, Uganda, México, Índia e Indonésia utilizam os mesmos padrões para classificar os cafés especiais que saem de suas fazendas.

Os cafés especiais

Mas é bom esclarecer que os cafés especiais não nasceram na década de 80. A bem da verdade, o famoso hotel du Crillon, em Paris, já em 1900,  oferecia a alguns de seus mais fiéis clientes, cafés que eram comprados de seletas fazendas de determinadas regiões da Guatemala e eram comprados em microlotes.

Os cafés especiais são originários da variedade Arábica. São cultivados em climas quentes durante o dia e frios à noite e são plantados em altas altitudes, de preferência, acima de 1000 metros. Quanto mais perto da linha do Equador, melhor a qualidade. Se estiver mais longe,  deve ser plantado em altas altitudes.

Os produtores precisam ter um cuidado especial durante todo o processo que começa na escolha das melhores mudas, no preparo correto do solo, no plantio, na adubação, no desenvolvimento dos pés durante os três ou  quatro primeiros anos antes da primeira colheita.

Depois, a secagem, o beneficiamento e o rebeneficamento ( descascamento, limpeza e classificação dos grãos) terminam o processo. A torra é um capítulo a parte.

O café verde é classificado de acordo com a inspeção visual e com o cupping. A inspeção visual consiste em trabalhar com um amostra de 350 gramas de grãos verdes e observar seus defeitos, que podem ser primários ( grãos pretos ou azedos), ou secundários (grãos quebrados). Uma amostra de grão verde café tem que ter menos do que cinco defeitos secundários e nenhum defeito primário para que possa ser classificado como café especial.

Para dar a pontuação correta do café é feito um cupping, uma degustação bem barulhenta que segue as regras da SCA 

O cupping envolve torrar o café e prepará-lo apenas com água quente a … graus, e depende da habilidade do provador em atribuir pontuações para cada atributo do café, como a acidez, corpo, sabor e aroma.

O cupping tem que ser feito por um provador que possua o certificado oficial de Q Grader. Mal comparando, o Q Grader é o sommelier dos cafés especiais. São profissionais que estudaram muito e ainda estudam para se aprimorar. Ele é um avaliador de qualidade, e que tem que passar por uma série de exames práticos desenvolvidos pelo Instituto de Qualidade do Café, COI, órgão internacional cujo principal objetivo é melhorar a qualidade da bebida. Para saber mais, acesse o site da SCAA.

De acordo com a SCAA, qualquer café que pontue de 80 pontos pra cima pode ser considerado café especial. Mas atenção: os de 80 pontos são os cafés especiais de entrada, os menos nobres.

Um café especial acima de 85 pontos já terá grandes atributos tanto de aroma como paladar, capazes de atrair compradores do mundo todo. Não apresenta defeitos e seus sabores são resultados de características especiais e da composição do solo em que foram produzidos.

Os Q Graders, ao provarem um café especial, são capazes de perceber notas de laranja, mel etc., numa simples amostra. Como os sommeliers. Mas isso não quer dizer que é necessário ser Q Grader para gostar de cafés especiais de qualidade nem ser sommelier para apreciar um excelente vinho. É preciso apenas treino. Como? Experimenando, experimentando, experimentando, até você achar um café que lhe agrade.

Onde comprar?

Até bem pouco tempo atrás, o Brasil só produzia café commoditie, aquele que é de mais baixa qualidade e que é comprado pela indústria alimentícia. Quem começou a convencer os produtores a investir na qualidade do café foi Ernesto Illy, da illy cafés (ver matéria completa sobre a illy aqui)

No Brasil, a cada dia que passa, a oferta de cafés especiais é maior. Seja nas cafeterias especializadas, nos sites de vendas online e até nas gôndolas dos supermercados. Mas não se engane: os melhores cafés especiais não estão nos supermercados por uma simples razão: essas redes precisam comprar grandes quantidades e os melhores cafés especiais são provenientes de microlotes. Não existe café especial pra todo o mercado consumidor.

Assim como um Chateau Lafite é pra poucos, um microlote de um Gueisha do Panamá, que pode custar até US$ 5 mil  o pacote com 250 gramas também é.

Nos supermercados é possível encontrar bons cafés especiais de entrada, de 80 pontos.  Grandes fazendas, como a Orfeu, por exemplo, oferece bons cafés de entrada por um preço bem razoável.

Como a imensa maioria dos cafés especiais se originam de pequenas propriedades, principalmente no Brasil,  o mais interessante é seguir os principais sites dos pequenos torrefadores como Juliana Ganan, da Bica, Pereira VilellaWolff CafésIsabela Raposeiras,  Cafés Martins, entre outros. 

Eles fazem o hunting,  ou melhor, a caça aos melhores cafés especiais, visitando as  pequenas fazendas e selecionando os melhores microlotes.E, a partir do trabalho de torra, de acordo com o perfil dos cafés, oferecer um produto de alta qualidade e fresco, já que a maioria entrega cafés torrados com, no máximo 15 dias. O que garante a qualidade dos cafés especiais oferecidos.

A torra dos cafés especiais  é um processo 100% natural.

Café Gourmet x Café Especial: atenção ao rótulo

Os cafés especiais não devem ser confundidos com cafés gourmet ou premium. Os dois últimos nasceram como termos de marketing na indústria, sem padrões muito definidos. Café gourmet pode ser um café de alta qualidade ou apenas marketing. Não tem um significado específico, mas sim uma conotação.

Geralmente, os cafés gourmet é que tem uma validade longa, de até 15 meses, vêem de grandes fazendas produtoras de café   e sua torra conta com produtos químicos, que transformam o sabor original do café.

Alguns até são também aromatizados, isso quer dizer que foi adicionado ao produto açúcares, aromatizadores e cremes para que se torne consumível.

Os cafés gourmet não são plantados em altas altitudes nem tem um cuidado pós-colheita tão aprimorado e, geralmente , as fazendas são totalmente automatizadas.

Se a sua praia ainda é consumir cafés gourmet, são fáceis de encontrar nas grandes redes de supermercados como Pão de Açúcar e Extra ou em diversos sites. O maior deles é graogourmet.com.br e o cafestore.com.br.