Por Mário Bittencourt*

Um estudo realizado por uma pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Agronomia da Universidade Estadual da Bahia (UESB) apontou alta correlação entre teores de nitrogênio (N) e índices vegetativos do cafeeiro, a partir do uso calibrado do sensoriamento remoto.

A publicação é uma das primeiras do Programa de Pós-Graduação em Agronomia da UESB que envolvem técnicas de Cafeicultura de Precisão, que, em resumo, se refere à aplicação das técnicas de Agricultura de Precisão à cafeicultura.

De autoria da pesquisadora Crislaine Alves Ladeia, o estudo foi disponibilizado recentemente no site do programa e teve orientação do doutor em Agronomia Odair Lacerda Lemos, coordenador do Laboratório de Geotecnologias Aplicadas da UESB.

Desenvolvida como requisito para obtenção do título de mestrado de Crislaine, a pesquisa foi realizada na fazenda Atalaia, em Encruzilhada, cidade do Planalto da Conquista, em uma área de 5 hectares de café da cultivar catuaí 62.

Conduzida em sistema irrigado por gotejamento e plantada no espaçamento de 3,7 m entre linhas e de 0,7 m entre plantas (3.861 por hectare, no total), a área de produção pesquisada tem pés de café com 6 anos de idade.

Conforme registrado na pesquisa, o clima da região onde está a área de produção foi classificado pelo método de Köppen como tropical, com temperatura média anual de 22,1 °C.

Análise nutricional e menor tempo de resposta

A pesquisa é importante sobre vários aspectos, sendo o principal deles, talvez, o fato de ser um estudo que faz utilização do sensoriamento remoto de forma calibrada para correlacionar os teores de N com índices vegetativos do cafeeiro.

Importante ferramenta de Agricultura de Precisão, já muito difundida em culturas anuais, como de grãos e fibra, o sensoriamento remoto na cafeicultura brasileira ainda tem baixa utilização em análises nutricionais.

Com o sensoriamento remoto, observa Crislaine Ladeia, é possível obter informações sobre um objeto, área ou fenômeno, sem que haja o contato físico, por meio de sistemas e sensores capazes de detectar, quantificar e analisar a radiação eletromagnética (REM) refletida, absorvida, transmitida e/ou emitida por esses alvos.

Tradicionalmente, a avaliação nutricional do cafeeiro é realizada por meio de análise foliar, um procedimento que, além de oneroso, é demorado, a ponto de não dar tempo fazer intervenções numa mesma safra.

O manejo nutricional do cafeeiro é uma das principais etapas da produção de café, sobretudo de qualidade. As recomendações de adubação para o cafeeiro, geralmente, são feitas considerando a produção esperada.

A adubação recomendada para um estande de até 4.000 plantas de café e produção de 8,8 litros por planta, de frutos cereja, é de cerca de 450 kg/há/ano de N, para que a recomendação dos teores foliares de nitrogênio para o cafeeiro alcancem entre 2,7 – 3,2% e sejam devidamente alcançados.

Um estudo de 2014 da Embrapa, sobre a produção de café no Planalto da Conquista, já apontava para a necessidade de melhores critérios de recomendação de adubação fosfatada no cafeeiro.

O estudo comprovou que “a adição do fósforo traz benefícios para a planta tanto em solos de média a alta fertilidade como também em solos de baixa fertilidade”.


Área de plantação de café em Barra do Choça, do Planalto da Conquista - Foto: Mário Bittencourt

Neste sentido, a pesquisa de Crislaine Alves Ladeia traz luz ao tema, e de forma inovadora, não só pelo uso calibrado do sensoriamento remoto, como também pelo fato de ser um estudo de Cafeicultura de Precisão sobre teores de N, o nutriente mais exigido pelo cafeeiro.

O N promove o crescimento rápido das folhas novas e o dos ramos plagiotrópicos, promove uma maior área foliar, maior produção de amido e outros carboidratos indispensáveis à formação e crescimento dos frutos.

Crislaine observa em sua pesquisa que os teores de N foliar variam de acordo com a fase da cultura, sendo reduzido drasticamente quando começa a formação dos frutos; e que o excesso do macronutriente, por outro lado, aumenta o risco de haver deficiência de zinco, boro, cobre, ferro, e maior susceptibilidade da planta ao ataque por doenças, como a Phoma e a Pseudomonas.

Por isso a importância de se saber os teores de N no cafeeiro em um tempo hábil para correção de eventuais problemas, o que o uso do sensoriamento remoto favorece.

Tempo e dinheiro

Em termos comparativos, na análise foliar tradicional, para ser feita na mesma área pesquisada por Crislaine, teria de ser gasto R$ 950 e os resultados seriam conhecidos após cerca de 30 dias.

“Com as metodologias de Cafeicultura de Precisão, com o uso de sensores, a análise foliar, já com os resultados finais, pode ser realizada em um único dia”.

O investimento é com equipamentos de tecnologia para obtenção e análise dos dados, os quais entram na relação custo e benefício, já que poderão ser utilizados durante outras safras.

No caso do trabalho de Crislaine foram utilizadas também técnicas de geoestatística, ramo da Estatística Espacial que usa o conceito de funções aleatórias para incorporar a dependência espacial nas análises estatísticas.

Os estudos em Cafeicultura de Precisão, em sua maioria, utilizam a geoestatística na aplicabilidade da técnica.

As pesquisas que vêm sendo realizadas sobre o tema, sobretudo no estado de Minas Gerais, maior produtor nacional de café, apontam para o aperfeiçoamento dos métodos de utilização da geoestatística na Cafeicultura de Precisão, o que varia conforme o que será avaliado e as características da região da área de produção.

Além de avaliar teores de N no cafeeiro e sua correlação com os índices de vegetação, Crislaine Alves Ladeia pesquisou também os teores de clorofila nos pés de café. Foram retiradas amostras de 20 folhas na área pesquisada, as quais serviram para análise laboratorial dos teores de N e clorofila.

No sensoriamento remoto, Crislaine utilizou o sensor óptico ativo manual terrestre GreenSeeker®, da Trimble, que emite radiação eletromagnética na banda do vermelho a 660 ± 12 namômetros e do infravermelho próximo em 770 ± 12 nm.

A medição foi realizada a 0,50 metros da cultura no terço médio da planta, nas mesmas plantas que foram realizadas a leitura do teor de clorofila. Também foi utilizado um drone (modelo não informado), equipado com sensor que capta a radiação do comprimento de ondas do visível (400 – 700 nm).

A área de estudo, segundo consta na dissertação, foi georreferenciada utilizando coordenadas obtidas por meio de um receptor GNSS geodésico, da marca Javad, modelo Thriumph I. O método de posicionamento utilizado foi o RTK (Real Time Kinematic).

Já os dados, foram processados no software Justin, com auxílio da base da Rede Brasileira de Monitoramento Contínuo (RBMC) para melhorar a acurácia dos vértices levantados em campo.

Após levantamento e processamento dos dados do perímetro, foi gerada uma malha amostral regular, com pontos de coleta de 33 x 33 metros, no software Quantum GIS, totalizando 49 pontos.

Para as análises de índices foram utilizados sensores passivos e ativos; para análises de teores de nitrogênio, foram feitas análises laboratoriais; e para avaliação da produtividade, foram coletados manualmente sobre panos os dados da produtividade de cinco plantas em torno dos pontos amostrais.

Crislaine Alves Ladeia observou em seu estudo que, dentre as diversas técnicas existentes para estudos ambientais, o uso do geoprocessamento, por meio do Sensoriamento Remoto – SR e os Sistemas de Informações Geográficas – SIG, destacam-se por possuírem diversas metodologias precisas e menos onerosas.

Ela constatou que os teores foliares de N obtiveram correlação alta com todos os índices avaliados, sendo da ordem de 0,62, 0,42, 0,49, 0,53 para índice de vegetação por diferença normalizada, índice de folha verde, índice de vegetação por diferença normalizada – verde e índice resistente à atmosfera na região do visível, respectivamente.

Sensores são ferramentas satisfatórias

Para a pesquisadora Crislaine Alves Ladeia, as análises não destrutivas, realizadas por meio de sensores ativos e passivos, demonstraram uma ferramenta satisfatória para a estimativa de nitrogênio foliar em plantas de café para a avaliação de primavera.

“Nas lavouras cafeeiras, os teores de nitrogênio não são homogêneos, existe quase sempre variabilidade e, em grande parte, essa variabilidade tem uma relação espacial, assim como os parâmetros fitotécnicos e a produtividade não ocorrem de forma aleatória”, ela observa.

“Com isso, o objetivo deste trabalho foi calibrar a utilização de métodos não destrutivos de avaliação de nitrogênio e estimar atributos fitotécnicos e produtivos para a cultura do café”.

A conclusão de Crislaine é a de que existem inúmeras possibilidades na utilização de sensores para estimativas de parâmetros nutricionais, fitotécnicos e de produção para a cultura do café.

“Há, porém, a necessidade de aprofundamento dos estudos para uma concretização das metodologias a serem aplicadas na cultura, levando-se em consideração suas particularidades”, afirma a pesquisadora.

Para acessar o estudo completo clique aqui.

*Mario Bittencout é Jornalista especializado na cobertura do agronegócio, com pós-graduação em Análise do Espaço Geográfico e em Comunicação e Marketing nas Redes Sociais. É colunista de agronegócio da Band FM em Vitória da Conquista e já atuou como repórter dos jornais A Tarde, Correio e Folha de S.Paulo.